quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A destreza de ser canhoto

O canhoto é aquela pessoa desajeitada que lê e escreve contra a corrente. O canhoto suja a mão com a tinta fresca das linhas que desenha, borratando sistematicamente o papel, como se carimbasse o registo com o seu tom de imperfeição. O canhoto não se converte. O canhoto não é suposto. É o contrário. É ao contrário. O canhoto começa a dançar com o pé errado e tem tendência a rematar do lado errado. O canhoto bate com o cotovelo no destro se ficar do lado direito numa secretária para dois. Insistentemente na vida à procura do lado certo. O canhoto é a parte da caderneta que nem serve para reclamar o prémio, zelando apenas para a identificação do vencedor. É isso mesmo um canhoto, é aquele que tem alguma utilidade mas não reside no grupo principal. E sobretudo porque não reside no grupo principal. A sofisticação do génio sem lugar.  Sem jeito. Que se apresenta como portador de um defeito que não é mais do que o feitio raçudo de ter um cérebro tão direito num mundo predominantemente esquerdo. O canhoto é uma troca de hemisférios num mundo que não troca de critérios quanto ao sentido da circulação.

2 comentários:

  1. alguém com a destreza de ser canhoto vem desajeitadamente escrever, sem borratar sistematicamente o papel SÓ porque escreve premindo teclas e não usando caneta (e papel), QUE ESTE TEXTO ESTÁ MAGNÍFICO!!!!
    A.DO.RO!!! :))
    de canhota para canhota um BjO* (pimita ;))

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  2. As tuas palavras só podiam ser escritas com "a mão de Deus" :) Obrigada.
    De canhota para canhota, um beijo,
    Ana Rute.

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