quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Hoje eu concorri a um concurso

Hoje eu concorri a um concurso.
Luta concorrida contra o tempo corrido entre morrer ou arriscar.
Escrita corrida contra a corrente rústica da preguiça.
Ruína da dúvida entre correr ou ficar.
A corrosão arruinada da ruptura é ver um recurso no rumo do percurso.
Hoje viver é ser concorrente da sua própria corrida.
E correndo nas ruas achar o seu curso.
E correndo de rasgo vencer o concurso.
Hoje eu roí a corda do tempo corroído.
Luta concorrida contra o casto rosnar avulso.
Da meta a corrente e eu achei o curso.
Hoje sou só eu e o concurso.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Entrudos

Entre tudo o que se veste e se despe, sobra a essência do disfarce.
Na busca do amor serpentinam as linhas sinuosas de tantas histórias de se lhe tirar o chapéu...
Dantes eram as noites regradas pelo cronómetro, regadas pela raça sedenta, desfilando pelos corredores da aventura dos mais tremendos e intensos bailes de sentidos.
Hoje são tão longas e intermináveis as noites de espera, brindadas pelo cáustico negro dos medos, passando o cortejo sem som e conteúdo por entre as vastas e sujas pistas vazias.
Já não se joga a feijões.
Da esperança alimentada permanece o voto pelo corso transparente e livre, despojado, tão menos alegórico, no qual a realidade se agiganta ante um universo pessoal recôndito que se recolhe para o acolher.
Do fundo das perguntas e respostas, mesmo entre os silêncios mais castradores e absurdos, permanecem vivos os fogos doutros carnavais.
Entre tudo o que se veste e se despe, possa a essência sobrevir o disfarce.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

One Year Over

Sob a égide de um cataclismo visceral, recebeu casualmente o signo de Aquário.
Representa talvez somente uma tardia saída do armário.
Sendo de tamanha causa ilustre missionário.
De todos os pressupostos mais ou menos triviais é fiel depositário.
Inspira e suspira como um fim o grito e o eco mais arbitrário.
A rústica paleta dos sonhos é o seu abecedário.
Não havendo para o seu temperamento qualquer prontuário.
No seu código genético não sucumbe jamais a deixar de ser refractário.
A morada para onde parte não tem destinatário.
Gera semana a semana pronto e intangível honorário.
E, na realidade, será efectivamente para alguém um relicário.
Da Mãe babada,
Feliz Aniversário.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

No Teu Poema

Escrevo-te agora para dizer que ainda tenho a loucura de procurar o cavalo para percorrer em prodígio os prados com muitas flores.
E neles guardo as tardes em que me levavas pela mão para comprar a Rua Sésamo. Lá habitam também as primeiras idas à biblioteca, onde me convencias de que brincar com o dicionário era uma actividade simpática, mesmo quando eu ainda não podia saber compreender.
Nas rédeas abraço a cozinha onde me recebias como mais ninguém e a partir de cuja janela me vias tão única e amavelmente partir. Regresso sempre como dantes.
Em cada punhado de mundo de que me apodero, são nossas todas as cores, nelas deposito o teu brilho e também a tua sombra, vivo ainda a vida que sobra e que no tempo das borbulhas não pude conter.
Suave e ternamente.
Por tudo isso deixo aqui o primeiro poema que me ajudaste a decorar e que pretendo, assim como a tudo o resto, não mais esquecer.
Quero um cavalo de várias cores,
Quero-o depressa, que vou partir.
Esperam-me prados com tantas flores,
Que só cavalos de várias cores
Podem servir.

Quero uma sela feita de restos
Dalguma nuvem que ande no céu.
Quero-a evasiva - nimbos e cerros -
Sobre os valados, sobre os aterros,
Que o mundo é meu.

Quero que as rédeas façam prodígios:
Voa, cavalo, galopa mais,
Trepa às camadas do céu sem fundo,
Rumo àquele ponto, exterior ao mundo,
Para onde tendem as catedrais.

Deixem que eu parta, agora, já,
Antes que murchem todas as flores.
Tenho a loucura, sei o caminho,
Mas como posso partir sozinho
Sem um cavalo de várias cores?

Reinaldo Ferreira