terça-feira, 19 de julho de 2011

terça-feira, 12 de julho de 2011

Paradise lovers

Sabes, durante estes anos tenho-me sentado à mesa com outras pessoas. O mesmo duelo desnudo entre dois que se dão. Olhos nos olhos, degladiam-se as vontades do mundo e os votos profundos de cada qual. Uma ponte entre duas ilhas desabitadas donde desembarcamos, por momentos, sem nós. No início é sempre igual, os copos cheios. As almas vazias.
Acabei por te encontrar antes de terem passado vinte anos. As explicações podem ficar noutro tempo, em cima de uma mesa qualquer. O mesmo absurdo que despachou a nossas malas para parte incerta, veio depositar-nos aqui. Talvez as fantasias se tenham dissolvido no líquido em que afogámos as mágoas. Outros sonhos náufragos poderei devolver, embrulhados em trovas, numa garrafa qualquer.
Durante anos, a mesma sensação de tontura. O poder invencível da partilha. Primeiro desfiamos as feridas mais graves da terra. Depois, desterrados de tudo, desafiamos a gravidade. Desfeitas as dúvidas, desmorona-se o corredor entre as margens. Cada um para o seu canal sem destino, isolado. No fim, sempre assim. Na extremidade das almas cheias, os copos vazios.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

People are strange

Todas as manhãs, a mesma caneca amarela com meio litro de leite frio. A mesma torrada com margarina. O mesmo pão com oito cereais. A mesma concentração com que mastigo este mesmo pequeno-almoço enquanto ouço com a mesma atenção as músicas antigas da mesma estação de rádio. Os mesmos vestidos, os mesmos nós no cabelo, as mesmas sandálias compensadas. O mesmo gesto com as chaves de casa, sem fazer barulho. Saio. Bons dias ao vento e ao fresquinho, ao vizinho, ao senhor que foi comprar o jornal. Lá ficam os mesmos rascunhos desorganizados sobre a mesa, os mesmos vincos sobre a colcha, a mesma persiana entreaberta.
Todos os dias esta mesma particularidade patética de ser fiel a um cunho absurdo de mim própria. Fazer de conta que tenho a vida organizada, que sei o que me espera nesse lugar para onde vou. A mesma alimentação com substância para fazer face a qualquer desalento substancial. O mesmo ritual de arranjar em frente ao espelho a imagem conservada do que sou. A mesma mesmice inspirada na possibilidade de fazer tudo da mesma maneira e, mesmo assim, poder ter um dia diferente.