segunda-feira, 4 de julho de 2011

People are strange

Todas as manhãs, a mesma caneca amarela com meio litro de leite frio. A mesma torrada com margarina. O mesmo pão com oito cereais. A mesma concentração com que mastigo este mesmo pequeno-almoço enquanto ouço com a mesma atenção as músicas antigas da mesma estação de rádio. Os mesmos vestidos, os mesmos nós no cabelo, as mesmas sandálias compensadas. O mesmo gesto com as chaves de casa, sem fazer barulho. Saio. Bons dias ao vento e ao fresquinho, ao vizinho, ao senhor que foi comprar o jornal. Lá ficam os mesmos rascunhos desorganizados sobre a mesa, os mesmos vincos sobre a colcha, a mesma persiana entreaberta.
Todos os dias esta mesma particularidade patética de ser fiel a um cunho absurdo de mim própria. Fazer de conta que tenho a vida organizada, que sei o que me espera nesse lugar para onde vou. A mesma alimentação com substância para fazer face a qualquer desalento substancial. O mesmo ritual de arranjar em frente ao espelho a imagem conservada do que sou. A mesma mesmice inspirada na possibilidade de fazer tudo da mesma maneira e, mesmo assim, poder ter um dia diferente.

8 comentários:

  1. A monotonia...
    O culpado é o padrão de vida que está estilizado para cada pessoa em função do seu papel na sociedade. Daí se forma a monotonia. A sociedade aplica-nos um rótulo e acabamos por ser influenciados para o respeitar quase à risca criando-se assim um efeito bola de neve (mais monotonia cria mais monotonia).
    Imaginemos que num certo dia, para quebrar a monotonia e para sentir a liberdade em todo o seu esplendor, me apetece ir dar um passeio de bicicleta, todo nu! Provavelmente a sociedade da qual faço parte olhasse para mim e dissesse: people are strange... :)
    Obviamente há valores éticos e regras que têm de ser respeitados mas chegámos a um nível patético. A suposta liberdade está à muito comprometida pelos valores rígidos de uma sociedade cada vez mais robotizada e monótona.
    Abraço.

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  2. É humano cultivar hábitos, proteger uma determinada zona de conforto. É necessário admitir que há uma parcela de monotonia que todas as pessoas acarinham. Eu não me culpo por tomar todos os dias o mesmo pequeno-almoço, sabe-me bem!
    Cada pessoa deve usar da sua liberdade para decidir manter as rotinas que adora e mudar as que lhe fazem mal. Sobretudo, cada pessoa deve reflectir sobre as suas rotinas ao invés de culpar os outros por elas.
    Aconselho o leitor a concretizar essa fantasia com todo o esplendor e os devidos cuidados. Há sempre uma maneira menos estranha de se ser estranho.
    Um bom dia é aquele que começa igual aos outros e acaba de forma diferente.
    Abraço.

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  3. Eu não diria humano, diria consciente.
    A nossa mente consciente cria laços com o que a estimula de uma forma confortável e é ela que acarinha a dita parcela de monotonia. Acabamos por ser escravizados por ela... se adoptarmos um carácter conformista!
    Admito que combater a nossa própria consciência não seja tarefa fácil, mas por tentar, talvez não se perca nada.
    Projectar frustrações em direcção ao resto da sociedade? Longe disso. Mas, acreditando que ela afecta e limita os nossos actos, sejamos sensatos e atribuamos-lhe culpa.
    Beijo.

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  4. Amanhã de manhã vou sentar-me novamente diante da caneca amarela e vou desejar ser mais escrava dos meus prazeres do que dos caprichos hostis da sociedade.
    Façamos, de forma consciente e sensata, a diferença.
    Por tentar, de facto, não se perde nada.
    Beijo.

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  5. Gosto do amarelo ;-)

    Beijinho**

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  6. Posso, de facto, começar pela caneca! Nem me tinha ocorrido... Simples e eficaz. Obrigada :)

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  7. ;)
    Confesso que o amarelo não é a minha cor. Na verdade, escolho esta caneca porque é a única que leva exactamente meio litro de leite. Apesar de tudo, chego a gostar de a ver sobre a mesa assim, amarelinha.

    Beijo*

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