terça-feira, 3 de novembro de 2009

Danos Urbanos

Navega-se em ruas como mares secos onde ninguém cumprimenta, onde ninguém tem nome, onde ninguém importa. Os corredores de betão em homenagem a qualquer coisa que nos esmaga de pequenez. Passa-se pelo tempo agarrado ao ponteiro sem ver conversar as horas. Há velhos e cães e pedintes com estatuto decorativo incómodo que alguém votou à não importância. Há lixos e mágoas e gente perdida com estatuto de inutilidade social que alguém votou à não relevância. E trituram-se os dias com a pressa mórbida de quem atordoa uma verdade inconfidente. Os restos das noites leva-os a chuva, passa-se a ferro esse rosto enrugado ao nascer do dia. O céu é tão pesado que qualquer dor lhe parece leve. E leves seguem mil passos anónimos sem deixar marca. E no barulho intenso de todos os trânsitos, o silêncio das madrugadas. E no súbito interlúdio de todas as multidões coloridas, a solidão das manhãs. Nesse orvalho sombrio, tu. Sempre tu. Nunca esquecido. Oscilando entre o espaço ocupado, entre o tempo preenchido, entre o bafo da urbe, abafado. Sempre espaço para ti, para o teu tempo perdido.

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