domingo, 25 de abril de 2010

Ósculos

A solene loucura de uma coisa correr bem quando, na sua teia de complexidade e obscurantismo, teria essa tal coisa tantos trilhos conjecturais por onde correr mal.
Vejamos por analogia a suave metáfora de um beijo.
Quando se unem por duas bocas quatro lábios no surdo poema de um beijo unem-se também, e não o ignoremos, dois mundos de medos e sonhos assombrosamente egoístas e diferentes. Nessa ligação emergirá talvez uma súbita e mais lírica alteridade de oscular.
Quando um somatório de cerca de 64 dentes preparados e dispostos a cortar, triturar ou rasgar, habituados inclusivamente a protagonizarem o orgulho narcisista de um sorriso, se anulam em favor de um momento superior há um avassalador evento de humanidade que nos preenche.
Igualmente prodigiosa será a dança de mais ou menos proeminentes narizes. Não menos prodigioso será o ardil com que eventualmente se manobrem também próteses oculares e dentárias, prontas a fustigar... Cada alma tem os seus inefáveis detalhes.
Quando o veremos melhor saberemos então que até a rotina trilhada no sabor de um ósculo será ela não mais do que a vitória sobre um obstáculo que poderemos enfim comemorar.
Eloquente será ainda celebrar tal ardil da prevalência do afecto sobre a destruição num tal 25 de Abril onde também à dignidade indolor devemos profunda gratidão.

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